O "Nó" da Questão
Presenciamos na mídia uma oscilação entre dois pólos de opinião que atribuem a culpa de nossas mazelas políticas, ora ao baxíssimo nível moral de nossos representantes, ora aos eleitores incultos que não sabem votar ou vendem seus votos em troca de favores diretos.
Penso que não esteja aí a explicação para este “caos de imoralidade” e desesperança .
O “nó da questão” estaria no próprio sistema partidário, formado por dois “funis”, um de entrada , outro de saída, ou seja, difícil para entrar e conseguir a legenda, difícil para ser lançado como candidato.
O que afasta as pessoas de bem da vida pública é justamente a repulsa e rejeição à esta realidade, onde, para entrar, é necessário participar da sujeira, ter patrocínios ou explorar a boa-fé dos eleitores.
Um cidadão capacitado, com boas idéias e propósitos, porém, anônimo, que não tenha seu nome conhecido em virtude de sua profissão, simplesmente encontra as portas dos partidos fechadas e não consegue sua oportunidade de participar diretamente da política.
Por outro lado, radialistas, pastores, atletas, sindicalistas, líderes de associações, artistas, personalidades, intelectuais de prestígio, etc, usufruem de todas as facilidades para o ingresso nos partidos, porque trarão votos para as legendas.
Um administrador público formado e preparado para a função, nada conseguirá, pois os cargos disponíveis estão ocupados por incompetentes correligionários e cabos eleitorais de partidos políticos.
Quando ficamos doentes procuramos um médico e, se necessário for, nos submetermos à uma cirurgia, jamais permitiremos que um faxineiro do hospital nos opere.
O mesmo não se dá na administração da coisa pública.
O Voto obrigatório e a falsa concepção de “representatividade” são responsáveis por bizarrices e anomalias, admitidas sob uma hipócrita justificativa “democrática”.
Ora, todos sabem que a Democracia foi criada por iguais para funcionar entre iguais desde a antiga Grécia onde somente os “patrícios” podiam exercê-la, estrangeiros, plebeus e escravos não.
Da mesma forma durante os primeiros governos dos E.U.A , quando proliferaram grandes homens públicos idealistas como; Washington, Jefferson, Lincoln, isto enquanto o voto era proibido para a maior parte da população, circunscrito a uma elite mais esclarecida e culta.
A partir da gradual abertura para todos os cidadãos o nível foi progressivamente caindo até chegarmos ao fenômeno Ronald Reagan, um ex-artista de cinema de terceira categoria, que se reelegeu presidente com o menor índice de abstenção da história norte-americana.
Não devemos atribuir precipitadamente a culpa dos erros de escolha ao “povão” inculto e despreparado, sem a devida capacidade de tirocínio, pois, recentemente, a esmagadora maioria da elite e classe média mais esclarecida elegeu um sindicalista ex-metalúrgico e acreditou na “falácia” petista.
“Povão” não vota em “povão” para altos cargos da vida pública.
Só o faz quando as elites aceitam determinado candidato e este passa a ostentar aparência do “humilde” bem sucedido, “envernizado” e “glamourizado” pelo marketing , depois de aprovado no seio das classes dominantes.
A prova disso é Lula , um campeão de derrotas em eleições.
Disputou todas e perdeu mais do que o Maluf , até ser habilmente “maquiado” pelo publicitário Duda Mendonça.
O carnavalesco Joãzinho Trinta estava certíssimo quando declarou de maneira simples e sábia ; “pobre gosta de luxo, quem gosta de miséria é intelectual”.
Ética é coisa de classe média tradicional, não de “novos-ricos” nem das classe C,D e E.
Com raríssimas exceções, esta é a constatação nua e crua de uma realidade não aceita pelos que defendem o voto obrigatório e ainda crêem que , pelo fato de representar uma determinada parcela da população , um político cumprirá suas promessas de campanha .
Temos de encarar o fato de sermos um país quase continental, formado por todas as raças e etnias. Somos um exemplo do que existe no mundo. Uma “nação-planeta”.
Se resolvermos os problemas de desigualdades abissais do Brasil, estarão resolvidos os do mundo inteiro .
Imaginem um governo mundial democrático, onde o voto de um selvagem da Papua, Nova Guiné, valesse o mesmo do que o de um sueco. Podem imaginar o que sairia desta mistura desigual de culturas?
Tentem convencer um nômade das savanas africanas, que toca seu pequeno gado destruindo a vegetação que ele comete um crime ambiental. Ele responderá que, sem o seu gado não poderá se alimentar nem comprar novas esposas, pois esta é a moeda de maior valor em sua região.
Seria o mesmo que tentar fazer George Bush assinar o Tratado de Kyoto, ou que Israel aceitasse abrir suas fronteiras para os irmãos árabes.
Justificar, dizendo que a Democracia é justamente este conflito de interesses e opiniões é não querer enxergar o óbvio.
Se as atividades predadoras do pecuarista nômade africano representarem um perigo ecológico, então ele terá de abrir mão de comprar novas mulheres e passar a se alimentar de outra maneira.
Enquanto o votos de milhões como eles prevalecerem, impedindo providências urgentes, falharão todas as tentativas de uma Democracia dar certo.
Faz-se necessário estabelecermos limites ao alcance das decisões, caso contrário voltaremos ao Paleolítico, raspando pedras para fazermos setas.
Exigir e obrigar um habitante analfabeto da caatinga a votar sobre política nuclear ou acordos internacionais estratégicos, seria até maldade.
Os problemas mais próximos, de sua localidade, ele conhece e poderá opinar, porém, nem sabe onde está, nem onde fica o Brasil.
Portanto, uma verdadeira Democracia Direta, passa pela redução drástica das desigualdades culturais e longo processo de educação para o exercício do poder decisório individual.
Sem isto não existe cidadania.